terça-feira, 31 de março de 2009

Amo-o sem pensar nele...

















Não acredito em Deus porque nunca o vi.
Se ele quisesse que eu acreditasse nele,
Sem dúvida que viria falar comigo
E entraria pela minha porta dentro
Dizendo-me, Aqui estou!

(Isto é talvez ridículo ao ouvidos
De quem, por não saber o que é olhar para as cousas,
Não compreende que fala delas
Com o modo de falar que reparar para elas ensina.)

Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e sol e o luar,
Então acredito nele,
Então acredito nele a toda a hora...

Mas se Deus é as árvores e as flores
E os montes e o luar e o sol,
Para que lhe chamo eu Deus?
Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar;
Porque, se ele se fez, para eu o ver,
Sol e luar e flores e árvores e montes,
Se ele me aparece como sendo árvores e montes
E luar e sol e flores,
É que ele quer que eu o conheça
Como árvores e montes e flores e luar e sol.

E por isso eu obedeço-lhe,
(Que mais sei eu de Deus que Deus de si próprio?),
Obedeço-lhe a viver, espontaneamente,
Como quem abre os olhos e vê,
E chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes,
E amo-o sem pensar nele,
E penso-o vendo e ouvindo,
E ando com ele a toda a hora.



Ficções do interlúdio: Poemas completos de Alberto Caeiro. In: Obra poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1986.

domingo, 29 de março de 2009

sexta-feira, 27 de março de 2009

Não me convidem a ser igual

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É curioso como não sei dizer quem sou.
Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer.
Sobretudo tenho medo de dizer porque
no momento em que tento falar,
não só não exprimo o que sinto,
como o que sinto se transforma
lentamente no que eu digo...
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Sou como você me vê.
Posso ser leve como uma brisa ou
forte como uma ventania,
Depende de quando e como você me vê passar.
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Não me dêem fórmulas certas,
por que eu não espero acertar sempre.
Não me mostrem o que esperam de mim,
por que vou seguir meu coração.
Não me façam ser quem não sou.
Não me convidem a ser igual,
por que sinceramente sou diferente.

Não sei amar pela metade.
Não sei viver de mentira.
Não sei voar de pés no chão.
Sou sempre eu mesma, mas com certeza
não serei a mesma pra sempre.
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quinta-feira, 26 de março de 2009

Mãe desnecessária


A boa mãe é aquela que vai se tornando desnecessária com o passar do tempo. Várias vezes ouvi de um amigo psicanalista essa frase e sempre soou-me estranha. Até agora. Agora que minha filha adolescente, aos quase 18 anos, começa a dar vôos-solo. Chegou a hora de reprimir de vez o impulso natural materno de querer colocar a cria embaixo da asa, protegida de todos os erros, tristezas e perigos. Uma batalha hercúlea, confesso. Quando começo a esmorecer na luta para controlar a supermãe que todas temos dentro de nós, lembro logo da frase, hoje absolutamente clara: Se eu fiz o meu Trabalho direito, tenho que me tornar desnecessária.

Ser desnecessária é não deixar que o amor incondicional de mãe, que sempre existirá, provoque vício e dependência nos filhos, como uma droga, a ponto de eles não conseguirem ser autônomos, confiantes e independentes...

A cada fase da vida, vamos cortando e refazendo o cordão umbilical. A cada nova fase, uma nova perda é um novo ganho, para os dois lados, mãe e filho. Porque o amor é um processo de libertação permanente e esse vínculo não pára de se transformar ao longo da vida. Até o dia em que os filhos se tornam adultos, constituem a própria família e recomeçam o ciclo. O que eles precisam, é ter certeza de que estamos lá, firmes, na concordância ou na divergência, no sucesso ou no fracasso, com o peito aberto para o aconchego, o abraço apertado, o conforto nas horas difíceis.

Pai e mãe - solidários - criam filhos para serem livres. Esse é o maior desafio e a principal missão. Ao aprendermos a ser desnecessários, nos transformamos em porto seguro para quando eles decidirem atracar.


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terça-feira, 24 de março de 2009

sábado, 21 de março de 2009

Troca-te pelo desconhecido - IV Cântico

Adormece o teu corpo com a música da vida.
Encanta-te.
Esquece-te.
Tem por volúpia a dispersão.
Não queira ser tu.
Quere ser a alma infinita de tudo.
Troca o teu curto sonho humano
Pelo sonho imortal.
O único.
Vence a miséria de ter medo.
Troca-te pelo Desconhecido.
Não vês, então, que ele é maior?
Não vês que ele não tem fim?
Não vês que ele és tu mesmo?
Tu que andas esquecido de ti?

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Agora que sinto o amor

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Agora que sinto amor

Tenho interesse nos perfumes
Nunca antes me interessou que uma flor tivesse cheiro.
Agora sinto o perfume das flores como se visse uma coisa nova.
Sei bem que elas cheiravam, como sei que existia.
São coisas que se sabem por fora.
Mas agora sei com a respiração da parte de trás da cabeça.
Hoje as flores sabem-me bem num paladar que se cheira.
Hoje às vezes acordo e cheiro antes de ver.


Alberto Caeiro, in "O Pastor Amoroso"
Heteronimo de Fernando Pessoa

Anjo escondido

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Eu queria pentear o menino
como os anjinhos de caracóis.
Mas ele quer cortar o cabelo,
porque é pescador e precisa de anzóis.

Eu queria calçar o menino
com umas botinhas de cetim.
Mas ele diz que agora é sapinho
e mora nas águas do jardim.
Eu queria dar ao menino
umas asinhas de arame e algodão.
Mas ele diz que não pode ser anjo,
pois todos já sabem que ele é índio e leão.

(Este menino está sempre brincando,
dizendo-me coisas assim.
Mas eu bem sei que ele é um anjo escondido,
um anjo que troça de mim.)
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Cecília Meireles
Imagem: Helga Rodrigues

quinta-feira, 19 de março de 2009

O que eu quero...

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Estou atrás do que fica atrás do pensamento. Inútil querer me classificar: eu simplesmente escapulo. Gênero não me pega mais. Além do mais, a vida é curta demais para eu ler todo o grosso dicionário a fim de por acaso descobrir a palavra salvadora. Entender é sempre limitado. As coisas não precisam mais fazer sentido. Não quero ter a terrível limitação de quem vive apenas do que é possível fazer sentido. Eu não: quero é uma verdade inventada. Porque no fundo a gente está querendo desabrochar de um modo ou de outro.#
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quarta-feira, 18 de março de 2009

Guardar não é esconder

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Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.
Em cofre não se guarda coisa alguma
Em cofre perde-se a coisa à vista.

Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por
admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.

Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por
ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela,
isto é, estar por ela ou ser por ela.

Por isso melhor se guarda o vôo de um pássaro
do que pássaros sem vôos.

Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica,
por isso se declara e declama um poema:
Para guardá-lo.
[...]
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terça-feira, 17 de março de 2009

Simplicidade

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#Na simplicidade aprendemos que
reconhecer um erro não nos diminui,
mas nos engrandece, e que as pessoas
não existem para nos admirar,
mas para compartilhar conosco
a beleza da existência.
##
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sábado, 14 de março de 2009

Lua adversa

Tenho fases, como a lua
Fases de andar escondida,
fases de vir para a rua...
Perdição da minha vida!
Perdição da vida minha!
Tenho fases de ser tua,
tenho outras de ser sozinha.

Fases que vão e vêm,
no secreto calendário
que um astrólogo arbitrário
inventou para meu uso.

E roda a melancolia
seu interminável fuso!
Não me encontro com ninguém
(tenho fases como a lua...)
No dia de alguém ser meu
não é dia de eu ser sua...
E, quando chega esse dia,
o outro desapareceu...

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sexta-feira, 13 de março de 2009

Não tenho pressa

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Não tenho pressa. Pressa de quê?

Não tem pressa o Sol e a Lua: estão certos.
Ter pressa é crer que a gente passa adiante das pernas,
Ou que, dando um pulo, salta por cima da sombra.
Não; não tenho pressa.
Se estendo o braço, chego exatamente onde meu braço chega -
Nem um centímetro mais longe.
Toco só onde toco, não onde penso.
Só posso me sentar onde estou.
e isto faz rir como todas as verdades absolutamente verdadeiras,
mas o que faz rir a valer é que nós pensamos sempre noutra coisa,
E somos vadios do nosso corpo.


Poemas completos de Alberto Caeiro

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Cálculo matemático

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Porque eu fazia do amor um cálculo matemático errado: pensava que, somando as compreensões, eu amava. Não sabia que, somando as incompreensões é que se ama verdadeiramente



+
.
. .-*

quarta-feira, 11 de março de 2009

O Leitor

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Na verdade, cada leitor é, quando lê, o leitor de si mesmo.
A obra do autor não passa de uma espécie de instrumento óptico
que ele oferece ao leitor para permitir-lhe que consiga discernir o que,
sem tal obra, provavelmente não teria visto dentro de si.



Proust - O tempo redescoberto

terça-feira, 10 de março de 2009

Morre lentamente - Martha Medeiros

Morre lentamente quem não viaja, quem não lê, quem não ouve música, quem não encontra graça em si mesmo.

Morre lentamente quem destrói o seu amor-próprio, quem não se deixa ajudar.

Morre lentamente quem se transforma em escravo do hábito, repetindo todos os dias os mesmos trajetos, quem não muda de marca, não se arrisca a vestir uma nova cor ou não conversa com quem não conhece.
........................................................

Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz, quem não arrisca o certo pelo incerto para ir atrás de um sonho, quem não se permite pelo menos uma vez na vida fugir dos conselhos sensatos.
.................................................................

Morre lentamente, quem abandona um projeto antes de iniciá-lo, não pergunta sobre um assunto que desconhece ou não responde quando lhe indagam sobre algo que sabe.

Evitemos a morte em doses suaves, recordando sempre que estar vivo exige um esforço muito maior que o simples fato de respirar.
Somente a perseverança fará com que conquistemos um estágio esplêndido de felicidade."



Autoria
Martha Medeiros


 

Tenho que dizer a verdade




 














Clarice Lispector brincava com as palavras.
Leia o texto normalmente e depois em ordem inversa.



Não te amo mais.
Estarei mentindo dizendo que
Ainda te quero como sempre quis.
Tenho certeza que
Nada foi em vão.
Sinto dentro de mim que
Você não significa nada.
Não poderia dizer jamais que
Alimento um grande amor.
Sinto cada vez mais que
Já te esqueci!
E jamais usarei a frase
Eu te amo!
Sinto, mas tenho que dizer a verdade
É tarde demais...



domingo, 8 de março de 2009

Ouvir estrelas - Via Láctea soneto XIII

Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muitas vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...

E conversamos toda a noite, enquanto
A via-láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: "Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?"

E eu vos direi: "Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas
.

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sábado, 7 de março de 2009

Pedras no caminho?

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[...]
Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver, apesar de todos os desafios, incompreensões e períodos de crise.
Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas e se tornar um autor da própria história.


É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz de encontrar um oásis no recôndito da sua alma.
É agradecer a Deus a cada manhã pelo milagre da vida.

Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos.
É saber falar de si mesmo.
É ter coragem para ouvir um "não".
É ter segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta.
Pedras no caminho?
Guardo todas, um dia vou construir um castelo...

Imagem: micha gordin


sexta-feira, 6 de março de 2009

Gotinhas de Humor - Como manter a PAZ

A POMBA: É o pássaro da PAZ
A mulher:É a PAZ do passarinho
O homem:Busca a PAZ para seu passarinho
O solteiro:Não deixa seu passarinho em PAZ.
A solteira: Conhece o passarinho mas não a PAZ.
A divorciada: Perdeu a PAZ e o passarinho.
A bichinha: Quer a PAZ pela frente e o passarinho por trás.
A viuva: Lembra do passarinho e não vive em PAZ.
O viuvo: Perdeu a PAZ do passarinho.
A casada: Tem assegurado o passarinho e a PAZ.
O casado:Tem PAZ para o passarinho.
O velho: Tem o passarinho em PAZ.
A velha: Deveria estar em PAZ mas está sempre pensando no passarinho.
O menininho: Tem a PAZ mas adora segurar o passarinho.
A menininha: Também tem a paz mas está muito curiosa para conhecer o passarinho.

Até onde vamos para manter a PAZ?

- Sim amigos, eu sei que é uma grande bobagem....mas não resisti!

Os poemas são...

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Os poemas são pássaros que chegam
não se sabe de onde e pousam
no livro que lês.

Quando fechas o livro,
eles alçam vôo como de um alçapão.
Eles não têm pouso nem porto;
alimentam-se um instante em cada
par de mãos e partem.

E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhado espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti...



quarta-feira, 4 de março de 2009

Recomeçar

#
 









Não importa onde você parou...
Em que momento da vida você cansou...
O que importa é que sempre é possível recomeçar.

Recomeçar é dar uma nova chance a si mesmo...
É renovar as esperanças na vida e, o mais
importante...
Acreditar em você de novo.

Sofreu muito neste período? Foi aprendizado...
Chorou muito? Foi limpeza da alma...
Ficou com raiva das pessoas?
Foi para perdoá-las um dia...

Sentiu-se só diversas vezes?
É porque fechaste a porta até para os anjos...
Acreditou que tudo estava perdido?
Era o início da tua melhora...

Onde você quer chegar? Ir alto?
Sonhe alto... Queira o melhor do melhor...
Se pensarmos pequeno... Coisas pequenas teremos...
Mas se desejarmos fortemente o melhor e,
principalmente, lutarmos pelo melhor...

O melhor vai se instalar em nossa vida.
Porque sou do tamanho daquilo que vejo,
e não do tamanho da minha altura.



Autoria
Paulo Roberto Gaefke

terça-feira, 3 de março de 2009

É preciso coragem...

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A tristeza é uma das respostas naturais do coração para a perda.
Quando estamos tristes, nós nos dispomos a
sentir a verdade da nossa dor...
Pela nossa disposição ao lamento, lentamente nós
reconhecemos, integramos e aceitamos
a verdade de nossas perdas.
É preciso coragem para ficar triste,
para honrar a dor que carregamos.


Do livro: A Arte do Perdão, da Ternura e da Paz

domingo, 1 de março de 2009

A dor que dói mais

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Trancar o dedo numa porta dói. Bater com o queixo no chão dói.
Torcer o tornozelo dói. Um tapa, um soco, um pontapé, doem.
[...]
Mas o que mais dói é saudade.
Saudade de um irmão que mora longe. Saudade de uma cachoeira da infância.
Saudade do gosto de uma fruta que não se encontra mais.
Saudade do pai que já morreu. Saudade de um amigo imaginário que nunca existiu.
Saudade de uma cidade. Saudade da gente mesmo, que o tempo não perdoa.

Doem essas saudades todas.
Mas a saudade mais dolorida é a saudade de quem se ama.
Saudade da pele, do cheiro, dos beijos.
Saudade da presença, e até da ausência consentida.
[...]
Saudade é não saber.
Não saber o que fazer com os dias que ficaram mais compridos,
não saber como encontrar tarefas que lhe cessem o pensamento,
não saber como frear as lágrimas diante de uma música,
não saber como vencer a dor de um silêncio que nada preenche

Saudade é não querer saber se ele está com outra, e ao mesmo tempo querer.
É não querer saber se ela está feliz, e ao mesmo tempo querer.
É não querer saber se ele está mais magro, se ela está mais bela.
Saudade é nunca mais saber de quem se ama, e ainda assim, doer.
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Tu tens um medo - VI Cântico

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Tu tens um medo:
Acabar.
Não vês que acabas todo o dia.
Que morres no amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.

Que te renovas todo o dia.
No amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que és sempre outro.
Que és sempre o mesmo.
Que morrerás por idades imensas.
Até não teres medo de morrer.
E então serás eterno.
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