quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Separação





Desmontar a casa
e o amor. Despregar
os sentimentos das paredes e lençóis.
Recolher as cortinas
após a tempestade
das conversas.
O amor não resistiu
às balas, pragas, flores
e corpos de intermeio.


Empilhar livros, quadros,
discos e remorsos.
Esperar o infernal
juizo final do desamor.


Vizinhos se assustam de manhã
ante os destroços junto à porta:
-pareciam se amar tanto!


Houve um tempo:
uma casa de campo,
fotos em Veneza,
um tempo em que sorridente
o amor aglutinava festas e jantares.


Amou-se um certo modo de despir-se
de pentear-se.
Amou-se um sorriso e um certo
modo de botar a mesa. Amou-se
um certo modo de amar.


No entanto, o amor bate em retirada
com suas roupas amassadas, tropas de insultos
malas desesperadas, soluços embargados.


Faltou amor no amor?
Gastou-se o amor no amor?
Fartou-se o amor?

No quarto dos filhos
outra derrota à vista:
bonecos e brinquedos pendem
numa colagem de afetos natimortos.


O amor ruiu e tem pressa de ir embora
envergonhado.


Erguerá outra casa, o amor?
Escolherá objetos, morará na praia?
Viajará na neve e na neblina?


Tonto, perplexo, sem rumo
um corpo sai porta afora
com pedaços de passado na cabeça
e um impreciso futuro.

No peito o coração pesa
mais que uma mala de chumbo.


( Affonso Romano de Sant’Anna )
*

Um comentário:

Maria José Rezende de Lacerda disse...

Olá amiga. Essas coisas acontecem, infelizmente. São ciclos que vivemos. Quando um se fecha, com certeza, outro se abre para novas vivências. Beijos.

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